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sábado, 23 de outubro de 2010

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Um jovem imaturo e inocente, utópico e sonhador aprendeu algumas lições de uma maneira um tanto quanto prática. Caiu inúmeras vezes, tropeçou, se enganou ao imaginar que específicas mãos estariam ali estendidas para o ajudar a se levantar.
Menino bobo, ingênuo, criança-pura. De coração bom e mole, de bochecha corada, de vergonha estampada. De esperança insistente, tola, permanente.
Ah, ele era mocinho, menino, bobão. De amizades "eternas", "valentes", "fiéis". De amores "sinceros", "recíprocos", "arrebatadores". Pobre menino, a vida repleta de aspas, de significados ambíguos, de meias palavras.
Levou tanta porrada no rosto, na boca do estômago, no peito, no ego, que achou que estaria mais do que blindado contra as futilidades e os relacionamentos carregados de aspas do dia-a-dia. Desenvolveu sua própria vacina com pequenas doses de recordações, recentimento, proteção, revolta, desconfiança e amor próprio. Era sua fórmula mágica! De uma mágica sem segredos, sem receios, sem arrependimento.
Menino simples, de piadas boas e pensamento coerente. De fé forte e coração blindado. De andar firme e sem tropeços. Recomeço. De sombra insegura e trêmula. Passado. O andar agora é firme, pausado, seguro. Que de tão seguro trinca o asfalto, separa a areia, carimba a avenida.
Ele se torna seu próprio vigia, segurança, protetor. Que juntou dores e decepções passadas para construir o seu escudo. Equilíbrio.
Consegue rir de quem foi. Capaz de não se reconhecer quando olha a ingenuidade atrás. Era criança, agora quem é? Forte. Seja lá quem for.

"E quando achamos que temos todas as respostas, vem a vida e muda todas as perguntas"

Quando o Forte acha que está no controle do equilíbrio, a vida, o seu "eu", e as circunstâncias mostram que o mundo é tão instável quanto o que se passa dentro do seu próprio coração. A blindagem, o soro, o remédio... que podem fazer? Mudar o passado? Escrever um novo futuro? Ou, simplismente, dar a sensação momentânea de estar no controle de si próprio? Fantasiar.

Não tem jeito. As aspas continuam nos rondando. A surperficialidade sempre estará em algum lugar perto daqui. E, inevitavelmente, as pessoas falham e falharão. Inclusive o poço de certeza, fortaleza, segurança. Inclusive o Forte.
Desconfiar não é se manter seguro. Se reprimir nada tem a ver com convicção. Escudo-barreira não o faz mais coerente, o faz mais impermeável, intocável, não-humano.
Um dia, em algum momento, em algum lugar, alguém tocará o intocável. Simplesmente um dia, um gesto te arrancará uma lágrima. Um dia, uma palavra vai inspirar confiança, irá trazer o desejo de se entregar. Algum dia você não consiguirá ser racional. Inevitavelmente um dia, os seus pés sairão do concreto e deixarão as formas prontas que tem na terra. Quem sabe um dia você não se sinta um idiota novamente? Certamente se sentirá. Seu coração vai ser ferido denovo, você vai levar uma porrada no ego. Um bom amigo vai se transformar em um bom "amigo". E você vai voltar a sentir repulsa pelas aspas. E tudo isso não o torna fraco, ignorante ou incoerente, rapazinho.
Se dar a oportunidade de sentir, tocar, ouvir, respirar e sentir o sabor o faz, unicamente... vivo!
A vida nos dá inúmeras rasteiras, mas nós escolhemos alimentar a angústia, nos isolar em uma bolha anti-sensações, ou nos levantar e encarar o que a vida tem pela frente. Seja lá o que for.

Nossas certezas são traidoras. As mãos estendidas vêm de onde menos se imagina, da mesma forma que as lágrimas que o mocinho despejou no travesseiro vieram da pessoas mais "maravilhosa" do mundo. As aspas sempre nos perseguem, muitas vezes camufladas. A vida, essa sim, é capaz de nos ajudar a ver o que é superficial.

"O que já não me serve vai embora, e assim eu fico leve!"

O ser humano é capaz de se reconstruir quando não há nada a não ser destroços. Faça uma limpezinha no porão escuro do seu "eu".

Abraços,

Da Pekena.